segunda-feira, 3 de setembro de 2007

Projecto de seis anos termina em proeza inédita



Por: David Andrade
Foto: David Mdzinarishvili/Reuters (arquivo)

Depois do sonho, chegou a hora da realidade. No próximo dia 9, no Estádio Geoffroy-Guichard, em Saint-Etienne, entrará em campo, pela primeira vez num Campeonato do Mundo de râguebi, uma selecção amadora: Portugal. O que há uns anos atrás parecia uma utopia, é o resultado de um projecto de um seleccionador jovem, ambicioso, muito meticuloso e apaixonado pela modalidade. Tomaz Morais é o líder e conseguiu que um grupo composto por estudantes, médicos, designers, advogados, veterinários e engenheiros, entre outras profissões, acreditasse que seria possível chegarem onde ninguém acreditava. O feito inédito já foi conquistado, agora é tempo de enfrentar a dura batalha.Em 2001, quando Tomaz Morais assumiu o comando técnico da selecção portuguesa, os lobos, como são conhecidos os jogadores portugueses, eram apenas a trigésima selecção no ranking mundial e a modalidade era pouco ou nada reconhecida em Portugal. Sem apoios financeiros e estruturas desportivas, o râguebi português resistia à custa da vontade e da paixão pelo desporto dos seus praticantes. E foi essa paixão que levou um jovem de apenas 31 anos a aceitar o desafio de transformar o râguebi português.A primeira grande conquista de Morais aconteceu em 2003, com a vitória no Campeonato Europeu das Nações (considerado o Torneio das Seis Nações B). A vitória portuguesa levou a Federação Internacional de Râguebi (IRB) a nomear Tomaz Morais e a selecção nacional, em 2004, para os prémios de melhor treinador e melhor selecção mundial do ano, respectivamente. Portugal tornava-se, na altura, o primeiro país fora do círculo restrito das cinco maiores potências da modalidade (África do Sul, Austrália, França, Inglaterra e Nova Zelândia) a merecer tamanha distinção e reconhecimento. O objectivo seguinte era ainda mais ambicioso e assumido, nesse mesmo ano, por Tomaz Morais em entrevista ao PÚBLICO: "Temos que ser ambiciosos. Da nossa parte, vamos lutar arduamente para chegar ao Mundial de 2007".

Trajecto longo e difícil
E a luta foi, de facto, árdua. Para se qualificar para o Campeonato do Mundo, Portugal precisava primeiro de conseguir um bom desempenho no Campeonato Europeu das Nações que daria, às primeiras selecções classificadas, acesso a um torneio de qualificação para o mundial. Sem ter realizado uma performance brilhante, Portugal acabou por conseguir alcançar o terceiro lugar na competição (atrás da Geórgia e Roménia) garantindo um dos lugares na prova de acesso ao Mundial. Os adversários seguintes seriam a poderosa Itália e a Rússia. Num grupo onde apenas o primeiro classificado garantia o apuramento directo, o objectivo português passava por conseguir a segunda posição (que dava acesso a uma fase de repescagem), já que a Itália tinha praticamente assegurada a primeira posição. O primeiro desafio foi realizado em Roma, contra a selecção azzurri, e não correu nada bem à equipa treinada por Tomaz Morais: derrota por 83-0. Restava o último desafio, em Lisboa, contra a Rússia, e Portugal estava obrigado a vencer para manter o sonho da qualificação para o Mundial. Com o Estádio Universitário de Lisboa praticamente lotado, os portugueses tiveram que sofrer muito e, a nove minutos do fim, perdiam por 23-16. Um ensaio de Diogo Mateus, aos 71 minutos, acabaria por garantir o triunfo nacional e a manutenção do sonho português. Seguiu-se mais uma eliminatória, desta vez contra a Geórgia. Portugal, no entanto, não conseguiu ultrapassar os georgianos (derrota em Tbilissi e empate em Lisboa) e foi obrigado a uma última fase de repescagem. Se o primeiro adversário não colocou muitas dificuldades (Portugal venceu os dois jogos que disputou frente a Marrocos), o confronto decisivo contra o Uruguai foi dramático. Na primeira partida, em Lisboa, a selecção nacional exibiu-se a muito bom nível e esteve a vencer por 12-0, margem que garantia uma viagem até Montevideu com relativa segurança. No entanto, já em período de descontos da partida, uma desatenção portuguesa terminou em ensaio do Uruguai e Portugal partiu para o jogo da segunda mão com apenas sete pontos de vantagem (12-5). Em Montevideu, num jogo repleto de emoções fortes, os portugueses viram-se a perder a 15 minutos do final por seis pontos (18-12), mas aguentaram de forma heróica o ponto de vantagem que tinham no conjunto das duas eliminatórias até ao final da partida, concretizando assim a proeza inédita de chegar a um Campeonato do Mundo.

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